O VIDEIRINHO

terça-feira, novembro 29, 2016

ESTÁVEL

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Na sala de espera do dentista, pegas numa revista à sorte e dispões-te a folheá-la. 

Passas as páginas sem muito interesse, mais para aplacar os nervos: conselhos de beleza, cinema, música, moda... 

Detens-te num teste de personalidade. 

Lês as perguntas e mentalmente vais respondendo. 

Ainda que o aceites como um jogo, somas os pontos e chegas à conclusão que és uma pessoa emocionalmente estável. 

Isso diz a revista: 
Mais de 50 pontos, emocionalmente estável. 

“Sacaste 55”. 

Chama-te o dentista. 

Sentas-te na cadeira e abres a boca. 

Abandonas-te aos trabalhos do médico enquanto pensas na tua estabilidade emocional. 

Sentes como a agulha se introduz na tua gengiva, uma dor que pouco a pouco se transforma em anestesia. 

 

A tua vida sempre foi assim: uma soma de anestesias contra a dor. 

Meia hora mais tarde estás num táxi a caminho de casa. 

O taxista tem uma fotografia dos seus dois filhos dependurada no espelho retrovisor. 

Os efeitos da anestesia começam a desaparecer. 

A dor volta. 

Pela primeira vez, inverte-se o processo. 

Dizes ao taxista: 

- Páre aqui.
Aqui mesmo.

Pagas a corrida e sais do táxi. 

Está a chover.
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